Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Mês: abril 2011 (Page 1 of 3)

Barcelona baila no Benabeu!

 

A valsa catalã de um futebol rápido, rodado, insinuante, belo e irresistível, enfim, triunfa no Bernabeu. Não foi uma vitória qualquer.

A partida opõe um símbolo castelhano, um símbolo até falangista, à única manifestação de nacionalismo catalão permitida por anos.  A única manifestação permitida por Franco era o Futebol Clube Barcelona, que catalisou, assim, toda a noção de orgulho nacional catalão.

Quando ele joga, é como se entrasse no gramado a seleção da Catalunha que não se quer Espanha. Suas responsabilidades são enormes, portanto. Nada obstante a imensa responsabilidade, ele joga ofensivamente, não se acovarda a um futebol mesquinho, de lógica utilitarista e defensiva.

José Mourinho, um homem profundamente arrogante e sabedor de como tornar essa característica em publicidade pessoal, pôs-se a provocar o Barcelona e seu treinador, Josep Guardiola. Não se devem provocar símbolos nacionais, principalmente quando eles são eficazes e seus adeptos são fiéis.

Mourinho reviveu um postura dominadora anacrônica, serviu-se de um assunto que não se deveria prestar ao que ele reputa provocações estimulantes. Foi irresponsável e até ignorante.

Guardiola, elegantemente, disse que José já entrava nas partidas vencedor! E lembrou que José já trabalhou no Barcelona, ou seja, lembrou-lhe, algo sutilmente, que deveria saber de que se trata ou, pelo menos, poderia saber.

Se sabe, Mourinho preferiu ignorar e arriscar. Quem sabe não retorna para a Inglaterra, que ele afirma ser seu habitat natural! Realmente, o que há de melhor no futebol inglês são os franceses africanos e o verde impecável dos relvados.

Racismo no Brasil.

A Universidade Federal do Rio de Janeiro produziu um estudo nominado Segundo Relatório Anual de Desigualdades Raciais. Alguns números são reveladores do racismo brasileiro. Os pretos e pardos têm menos acesso à saúde e à educação, por largas margens. Por exemplo, os afrodescendentes com mais de 15 anos apresentam tempo médio de estudos de 6,5 anos e os brancos de 8,3 anos.

As diferenças já foram maiores e vem reduzindo-se muito lentamente. Mas, essas diferenças revelam o que se quer negar veementemente, a custo de agressões frontais à lógica e às evidencias. O combate à evidência intensificou-se com a adoção de políticas afirmativas de inclusão.

A base do ataque às políticas afirmativas, de reserva de cotas, por exemplo, é a negativa das diferenças e dos conflitos. Por outro lado, ao mesmo tempo em que se tenta combater as cotas raciais, tenta-se esconder que a situação de sempre configura uma verdadeira política de cotas a favor de uma minoria que se julga devedora apenas de si, individualmente.

O modelo social brasileiro é profundamente perverso e sofisticado. Ele conseguiu um êxito raro entre os grupos humanos: manter níveis de desigualdades sociais e raciais muito profundos e evitar a explosão que seria natural esperar-se. E fê-lo com níveis de violência sistemática mais reduzidos que em outras experiências do gênero, como a sul-africana, por exemplo.

Claro que há níveis de violência não sistemática avassaladores, ou seja, de criminalidade dita comum. Ela, de certa forma, desempenha o papel repressor que a violência sistemática e organizada tem nos modelos excludentes tradicionais. Ele é somente aparentemente aleatória, porque os números revelam que as maiores vítimas são precisamente dos grupos excluídos e que se devem controlar.

A contenção social e a punição violenta por meio da criminalidade comum ainda tem uma vantagem de cunho psico-social que é afastar a percepção individualizada de culpa, seja de um e outro indivíduo, seja do governo, seja de uma certa classe social. Ela parece mesmo aleatória, embora não seja.

As partes mais engenhosas do formato brasileiro de exclusão são os múltiplos disfarces sob que ele esconde-se. Muitos escritores de grande talento – intelectuais, diriam alguns – contribuíram esforçadamente para a consolidação da idéia de mitigação das diferenças. E, aparente contradição, fizeram-no celebrando uma miscigenação que não foi uma integração. O caso mais notável é o de Gilberto Freyre.

A celebração da miscigenação racial a partir de elementos curiosos ou pitorescos, encadeados com fibras de ciência social, firmou a noção da democracia racial, até mesmo da esculhambação racial, como se no Brasil essas fronteiras se tivessem abolido em um conúbio de lubricidade e promiscuidade racial profunda. O que pode ser muito verdadeiro em termos puramente sexuais, não tem qualquer sentido social, contudo.

Muitos se compraziam em comparar essa suposta democracia racial brasileira com a segmentação evidente ocorrida nos Estados Unidos da América. Ou seja, ativeram-se ao aspecto puramente sexual e cromático da questão, deixando de lado as resultantes estruturais na sociedade.

A miscigenação, no Brasil, deu ensejo a uma estratificação cromática, a uma escala de branquitude a ser galgada constantemente, ao longo de gerações. Uma escala que correspondia, quase que à exata proporção, àquela do ascenso social e econômico. Quer isso dizer que a miscigenação considera-se um caminho programático de despreteamento da população, algo muito diferente de democracia racial.

A configuração da estratificação cromática sempre foi eficazmente disfarçada pela crença na ausência de barreiras raciais, quer dizer, na carnavalização das relações entre indivíduos e grupos de origens sociais e raciais diferentes. O modelo impôs-se fazendo acreditar que existe, sim, hierarquia social, mas que não existe racial.

Todavia, os valores cultivados, nomeadamente os estéticos, também permitem ver que a hierarquização não é apenas social e econômica, mas racial. Claro que descortinam a questão mais sutilmente que os números reveladores da nítida exclusão por raça. Interessam exatamente porque são uma via de percepção mais sutil.

É notável que os padrões desejados de estética corporal, em sua maioria, claro, apontam para o branqueamento. Assim, em exemplo bem redutor, buscam-se cabelos claros e lisos e não o inverso. Buscam-se traços fisionômicos caucasianos e não é à toa que este país é o campeão mundial na área da cirurgia plástica!

É inegável que há forte miscigenação racial no Brasil e que as classes intermédias são compostas de mestiços. Porém, é também inegável que as classes dominantes, nos seus estratos mais altos – digamos os 02% – são quase integralmente compostas de brancos, que se apropriam da maior parte das rendas nacionais.

Os números e conclusões apresentados pelo estudo da UFRJ indicam que os pretos e pardos têm qualidade de vida inferior aos brancos, sob qualquer aspecto objetivo considerado. Ora, isso não tem outra explicação senão um profundo, dissimulado e continuado racismo. Sim, porque a única explicação restante não convém aos racistas atualmente, excepto por um e outro grupo francamente defensor de superioridades raciais.

Os líderes da dominação, de qualquer delas, sabem que precisam esconder, primeiro a própria dominação, segundo suas causas, terceiro sua inércia. Precisam exercer o domínio por meio do que os norte-americanos chamam soft power, ou seja, mediante o engano, a confusão e o disfarce.

Trata-se de asseverar que existe a igualdade e de pô-la nas leis, formalmente. Trata-se de assegurar que as oportunidades são iguais, ainda que o sejam somente nos papéis escritos. Trata-se, enfim, de esconder que há uma tremenda inércia social e que isso é decisivo para que alguém esteja onde está.

Se alguém consegue perceber, ainda que discretamente, o papel da inércia social, logo o modelo lançara nuvens sobre esse pedacinho de compreensão e falará como se tudo se limitasse ao recebimento ou não de heranças. Pois o domínio implica também em fazer ele mesmo a pauta de discussões e delimitar como os assuntos serão abordados. Assim, ele conduz às conclusões que lhes convém, ou conduz à falta de conclusões, à confusão e a mais nuvens.

 

 

É o petróleo, estúpido!

Em 1979, os norte-americanos começaram a temer que a virada autonômica sucedida no Irã se espalhasse por todo o médio oriente e norte da África. Temor um pouco explicado pela insistente ignorância de que a Pérsia não tem nada a ver com a arábia, excepto pelo islamismo. Pode ser difícil de acreditar, mas a diplomacia norte-americana costuma ser ignorante, talvez por excesso de confiança.

O fato é que temiam um aumento grande dos preços do óleo cru, além da dificuldade de explorá-lo a partir de suas próprias companhias. Tinham na memória as nacionalização de Mosaddegh, algo que os tinha obrigado a promover um golpe e patrocinar o Xá Phalavi, um usurpador dócil às Shell e British Petroleum da vida.

Quando os problemas circunscreviam-se à Península Arábica, ao Magreb e à Cirenaica, era mais fácil de resolver, bastanto, muitas vezes, chamar a aviação israelense. Mas, com o Irã, era diferente.

Partiram para uma tentativa óbvia: armar o Iraque, por a soldo o chefe sunita Hussein, e manda-lo incomodar o Irã com uma guerra totalmente sem sentido para os guerreantes. A guerra custou caríssimo, mas não resultou no desejado, ou seja, não conseguiu levar o Irã à falência e à sucessiva ocupação ocidental.

O chefe sunita Hussein, certo de ter tentado cumprir sua missão e de contar com alguma solidariedade dos seus chefes, parou um pouco de ser instrumento e foi cuidar de governar seu feudo babilônico. Deve ter percebido que, para agradar minimamente os súditos, precisava desagradar também minimamente as companhias petroleiras estrangeiras.

Os EUA e seus acompanhantes europeus não podiam descuidar de um assunto tão importante quanto o preço do óleo combustível. Organizaram um grande bombardeio e, alguns anos depois, uma invasão militar. Ocuparam o Iraque, militarmente, destruíram sua infra-estrutura, dissolveram a precária arrumação de forças que lá havia e escolheram outros bandidos para comporem um governo de farsa.

Criou-se demanda para as indústrias bélica, de construções, de fornecimento de mercenários e, principalmente, garantiu-se abastecimento de óleo.

Hoje ou, melhor dizendo, antes do bombardeio da Líbia, vinham de lá 15% do petróleo consumido na França. É uma parcela muito significativa, o que explica a avidez gaulesa em agredir a Tripolitânia e a Cirenaica. Esse fornecimento não estava ameaçado, porque o regime conduzido por Gaddafi havia-se articulado aos interesses das petroleiras.

Acontece que outros países norte-africanos e árabes viviam revoltas populares contra governos absolutamente vendidos e dóceis aos interesses ocidentais. E, por outro lado, absolutamente contrários às maiorias de suas populações. Era a perfeição de um neocolonialismo sem tropas de ocupação. Bastavam algumas famílias de saqueadores locais e as companhias européias e norte-americanas, com livre trânsito.

A Líbia, embora Gaddafi tenha-se transmutado de cão louco em sábio amigo, revelou-se o objetivo ideal de uma ação exemplar. Precisamente onde os indicadores sociais eram os melhores e a população a mais rica dos Estados Norte-Africanos. Precisamente onde jorra o petróleo mais leve e mais fácil de ser refinado.

Aqueles a quem chamam rebeldes são uma gente que não gosta de Gaddafi, mas tampouco quer, em sua maioria, ser escrava de franceses, ingleses e norte-americanos, como simples instrumentos de um saque a recursos naturais. Apenas subornando-os e dando-lhes armas, não será suficiente para obter-se o país.

Terão que invadí-lo, ou seja, fazer da forma mais cara o que já funcionava da mais barata. O momento crucial deu-se quando Gaddafi, pressionado, disse que venderia seu óleo apenas a chineses e russos. Daí surgiu toda a bravura francesa na defesa dos interesses humanitários de meia dúzia.

Esse mapa acima, da divisão do saque ao Iraque, já está pronto para a Líbia. Nele, certamente a Total tem um quinhão maior, na proporção de quantas bombas e quantos Rafales as despejaram na Cirenaica. Assim são as ações humanitárias aprovadas pela ONU. Quer isso dizer que o petróleo humanizou-se?

 

Fernando Henrique Cardoso está senil?

Não me conto no número dos que se envergonham de usar os termos direita e esquerda. E também não estou entre aqueles que evitam os termos classe dominante e dominada.

Com relação a esquerda e direita, além de tratar-se de coisas distintas, é qualificação útil para falar-se de política, independentemente de qualquer carga valorativa. Ou seja, existem os lados de esquerda e de direita e isso não significa que existam os lados bom e mau, que isso é lógica binária de pastor evangélico.

Dominantes e dominados é uma díade muito mais interessante, porque atravessa um largo espectro social e econômico.  Os dominantes no topo da sociedade tentam impor a não utilização do termo, porque a dominação mais efetiva impõe o próprio disfarce.

No sentido contrário, é válido afirmar que quanto mais ostensiva uma afirmação de domínio, menos efetiva ela é. O domínio profundo é aquele que se nega, que se esconde, que não se vê e não se percebe muito claramente. A ele convém ser assim nebuloso, porque o que não se vê não se ataca.

De uns tempos para cá, uma parte mais restrita da classe dominante brasileira, a parte mais aparentada ao financismo, enfrenta dificuldades em fazer a maioria da população comportar-se explicitamente contra si própria. Ou seja, perdeu um pouco a capacidade de enganar os dominados.

Assim, perdeu também três eleições presidenciais. Estranhamente, dá sinais de não perceber as razões disso, o que é deveras preocupante, como o viciado em estupefaciantes que não percebe o vício. Nada obstante, em lamentável falta de pudor, expõe sua incompreensão publicamente, como um lamento de ideólogos.

Essa indignação não tem mesmo razões para ser tão profunda. O povo não se tornou, de uma hora para outra, conhecedor das coisas, instruído ou liberto das amarras e disfarces que lhe turvam a visão. É, basicamente, o mesmo de sempre, enganado, ignorante, incapaz de distinguir o que está por trás do jogo mediático e político; premido pelas circunstâncias do dia-adia.

O que aconteceu, para que o povo não escolhesse os maiores dominantes, ou seja, para que não votasse contra si próprio novamente, foi simplesmente que os dominantes passaram dos limites do razoável na dominação. Aprofundaram o que já era muito profundo.

Acreditaram que era possível seguir aprofundando desde que as Globos, Vejas e Folhas seguissem seu bombardeio de mentiras e desinformação. Há precedentes desse tipo de engano. Adolfo Hitler acreditou em Göering, quando este assegurou que a Luftwaffe abasteceria as tropas da frente oriental. Ele precisava acreditar!

Mas, não deu. O modelo da gente representada por Fernando Henrique é concentrador demais, exclusivista demais, menos intelectualmente requintado do que pretende, mais vil do que uma e outra privatização sugere. É absurdo que um modelo de predação – quase aleatório – tenha chegado a crer-se um projeto de poder de longo prazo, o que evidentemente não era.

Que um e outro ideólogo forjado na ditadura mergulhe na impostura de reclamar do sistema político, como se fosse um democrata visceral, não surpreende. Não há o direito a enganar-se ou surpreender-se com farsantes que estiveram, em determinado momento, no lugar de evidência política, a revelar nada mais que oportunismo.

Todavia, que Fernando Henrique Cardoso tenha atitudes que permitam questionar sua inteligência é de surpreender mesmo. Não que seja o autor que ele, Fernando Henrique, supõe-se. Mas, o homem foi presidente da república por oito anos, foi o corretor – mor de venda do país por oito anos.

Ele foi ungido pelos dominantes e por significativa parte dos dominados. Não é um qualquer, portanto. Ele é o chefe de um partido, o representante na política de grande parte da classe dominante brasileira. Ele representa, no Brasil, interesses estrangeiros os mais variados. Ele costumava ser um homem de bons modos, de gestos corteses, de fala mansa, embora balbuciante e repleta de erros que nunca reconhecerá.

Pois Fernando Henrique diz que seu partido político – em provável marcha para a extinção – deve apoiar-se nas classes médias, deve identificar-se com elas, defender seus interesses. Que não deve preocupar-se em manter alguma interlocução com o povão. De minha parte, agrada-me bastante que sigam essa receita, pois assim precipitam-se de vez.

Fernando Henrique deve ter conhecimento bastante de que as classes médias são o que há de mais próximo, em termos de sinonímia, de ingratidão. Não há uma classe ou estrato social menos confiável que a média, nem menos dotada de honorabilidade.

A razão disso é que se julga meritocrática, ou seja, que se julga devedora de ninguém. Acredita que as migalhas que recebe de cima, ganhou-as por direito próprio ou divino. Acredita mesmo! É absolutamente incapaz de reconhecer sua incapacidade, sua pequeneza, suas dívidas sociais.

Crê-se plena, suficiente, devedora de si própria, apenas. Todavia, vende-se por qualquer coisa e depois não se considera corrupta ou corruptível. Ou seja, se fosse uma pessoa só seria o tipo do perfeito patife que ganha algo, mata o doador, sai a difama-lo e a elogiar-se a si próprio.

Fernando Henrique acha mesmo que um projeto político sério e grande pode apoiar-se nas classes médias brasileiras? Elas não admitem recuos em termos sociais e econômicos, porque crêem que suas posições são estáticas e imutáveis. Sua visão não é dinâmica, porque tomam o ponto de referência como ponto de partida.

Fernando Henrique não ganhou a terceira eleição presidencial exatamente porque levou a concentração a nível tal que implicou perdas para as classes médias. Elas não perdoam! Agora, ele convida seu partido a ser o representante das classes médias! Pode ser efeito da senectude.

 

 

 

Mulher nova, bonita e carinhosa, por Amelinha.

Não me acusem pelas imagens falsificadas de filme norte-americano. O vídeo tem dos melhores sons dessa canção que Zé Ramalho reivindica e que Amelinha canta como ninguém.

Essa canção sempre me chamou atenção, belíssima. Um tio meu, muito estimado, dizia-me que isso era de domínio público, que um cego na cidade pequena em que ele nasceu já cantava versos dela, na rua.

Não sei, mas que é bonita é.

Contra a homofobia, que recrudesce neste país de imbecis.

 

O Brasil é aquele lugar onde semeiam-se tempestades, embora já seja bem servido de ventos fortes. Mas, é aquela estória, o pior é o que ainda falta acontecer.

Firmes nos seus propósitos de laborar para piorar as coisas, desagregar o que já é mal arrumado, instilar o conservadorismo odioso, fazer regredir direitos fundamentais precariamente estabelecidos, a grande imprensa do país deu em estimular a homofobia.

É ilegal? É, sim, mas e daí? Certos grupos – e a imprensa insere-se destacadamente como um desses – operam segundo legalidade própria, auto-concedida e auto-interpretada, seletivamente. Não é o caso daquele lugar-comum de estar-se acima da lei, mas de ser o legislador de si mesmo.

A partir de argumentos de induvidosas tolice, superficialidade e má-fé, disseminam o ódio contra homossexuais, que já são grandes vítimas de estigmatização social e de violências físicas quase nunca punidas.

A coisa tem forte matriz religiosa, notadamente nos extremismos evangélicos, de uma superficialidade de poça d´água. Qualquer semi-alfabetizado incapaz de apontar em um mapa o sítio do lago da Galileia é capaz de enfileirar meia dúzia de citações mal traduzidas da Bíblia hebraica, para delas extrair um ataque virulento contra uma forma de sexualidade.

O que há de má-fé nisso é a deformação das idéias de liberdade e de vontade. Alguém tem vontade de urinar e não é propriamente livre para não na ter. Por outro lado, alguém não tem a pele amarela, por exemplo, como uma emanação de vontade livre. Alguém não tem olhos azuis como resultado de uma livre opção.

Da mesma forma, alguém não tem essa ou aquela sexualidade devido a uma opção livre. E, mesmo que assim seja, por ampliação racional do universo lúdico e lúbrico, será uma questão de liberdade individual e pronto.

Não há deuses metidos com essas coisas, que se houvesse deuses do tipo, seriam os mais cretinos imagináveis e menos divinos possíveis. Ora, deuses que cuidam de sexualidade são figuras de revistas de fofocas de novela!

As massas, todavia, são sensíveis aos extremismos. São – é trágico – sedentas por exclusão, querem ter sua parte ativa na exclusão. Elas, que são totalmente excluídas do processo decisório e da apropriação da parte relevante das riquezas, querem seu quinhão do poder de excluir.

Então, entregam-lhe essa parte, a exclusão por estigmatização social, a exclusão por diferença física ou comportamental. Elas, alheias ao grande jogo, aceitam sua parte e exercem a exclusão com gozo indisfarçável. Mais adiante, todavia, não mais se satisfarão apenas com isso. Quererão o direito a linchar, que é a resultante inevitável de semear as tempestades.

 

 

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