Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Mês: julho 2011 (Page 2 of 4)

Mortes em Oslo e a imprensa a ser plenamente a imprensa!

Explodiu uma bomba em prédio do governo norueguês e morreram sete ou dez pessoas. Depois, parece que quarenta minutos depois, na ilha Utoya, um fulano matou, a tiros, mais de oitenta pessoas.

Os episódios ensejaram notícias comovidas e as costumeiras análises, imediatas e superficiais. Quase em uníssono, a imprensa, sem ter analisado coisa alguma, sem ter tido acesso a maiores detalhes, estampou os nomes terrorismo islâmico. Sim, porque só podia ser isso, tinha que ser isso.

Gente que se dá ares superiores e quer ser chamada de jornalista escreveu artigo, aqui e acolá, analisando a escalada da ameaça terrorista, islâmica, é claro.

Um mísero dia depois, tudo aponta para um radical direitista cristão, como autor! É perfeitamente plausível que o autor seja mesmo o radical Anders Behring Breivik que, como é comum nos casos, deu todas as pistas do que poderia fazer.

Apenas esses sinais costumam serem reunidos depois dos acontecimentos, o que é até melhor, porque do contrário a paranóia vivida seria maior. Tudo é previsível e quase nada é evitável, convém aceita-lo.

O mais interessante é a imprensa a ser o que é, às claras: superficial, ignorante dos fatos, desprezadora dos fatos na verdade, ávida por condenar sumariamente, presa de suas tolices assumidas como verdades, veículo de mão-única e de pouco pensar.

Outra coisa é interessante: será que a cristandade reivindicará para si o grande feito!

Lua Cambará abre Festival de Inverno de Campina Grande.

Um belo espetáculo de dança contemporânea, Lua Cambará, do grupo Ária Social, abre o Festival de Inverno de Campina Grande, no reformado Teatro Municipal Severino Cabral.

O tema é de inadequação social, peso de convenções, falta de amor e o penar de almas a vagarem, em resultado da desagregação inevitável. O penar é trágico, por inevitável. O espetáculo é muito bem produzido e envolve sessenta artistas, entre bailarinos, cantores e músicos.

Para mim, de certa forma, a personagem mais interessante é o Teatro Municipal, agora reaberto; talvez o prédio mais bonito de Campina Grande. O teatro compõe uma bela paisagem urbana, harmonioso com o sítio onde localiza-se, algo raríssimo nessa cidade de poucas belezas urbanísticas. Visto desde a Avenida Floriano Peixoto, quer dizer, de cima, está em perspectiva perfeita.

É pena – e estava para falar nisso há tempo – que uma de suas mais belas partes seja alvo de agressão imensa e pouco percebida. Nas costas do teatro, ou seja, na parte que dá para o Parque do Açude Novo, há imenso painel em cerâmica. Este painel tem uma libélula, uma tartaruga, um peixe e uma garça. A obra, como todo o teatro, é tombada, por ser patrimônio artístico.

Embora tombada, foram levantados dois prédios atrás, a impedir a visão completa do belíssimo painel. Absurdo e ilegalidade óbvias, tolerados como se nada estivesse a acontecer, nessa terra de pouco apreço pela beleza e pelas legalidades.

O tombamento impede que se retirem as possibilidades de contemplação da beleza do prédio, mas foi sumariamente desprezado com as construções de dois prédios desprezíveis, contiguamente.

Hoje, se alguém diz isso é obrigado a ouvir o argumento do fato consumado. Por tal argumento, um absurdo ilegal consagra-se porque se fez e pronto. Estão lá os feios e ilegais prédios, deviam ser postos abaixo, mas ficarão onde estão, a impedir a visão do painel bonito, simplesmente porque lá estão.

Ninguém se lembrará desses prédios, excepto por terem enfeado o teatro. Deste último, qualquer pessoa que tenha algum senso estético lembrar-se-a.

O Brasil toma o remédio antes da doença.

A propaganda do estilo de vida norte-americano e, em menor escala, do europeu, fez crer que esse é um padrão a que todos poderão aceder, bastando para tanto vontade, trabalho e adoção de certas regras. Óbvio que isso é mentira e que os divulgadores principais dela sabem-no.

Mas, isso vende-se e compra-se. O fato é que padrões de consumo como o norte-americano são inviáveis, exceto se 90% do mundo continuar a viver em privações e miséria.

Há uma questão de finitude – que não se confunde com maltusianismo puro – inescapável. Finitude de recursos naturais. O caso mais evidente é o petróleo, que se gasta demasiado no modelo de consumo elevadíssimo.

A única solução, exceto, é claro, a continuação da espoliação, é o empobrecimento seletivo dos mais ricos. Digo assim para escandalizar mesmo, embora o dito encubra maiores sutilezas e nuances.

Trata-se de nivelar por baixo e não porque seja um projeto mesquinho, mas porque nivelar por cima é impossível e quem afirma a possibilidade sabe que está mentindo ou é simplesmente um tolo a repetir o que ouviu dizer.

O gasto de uns é de coisas que vieram de outros. Para que o gasto seja elevado, os vendedores devem entregar o que têm a baixo preço. Se o que uns vendem vai escasseando e eles não aumentam o preço ocorre o empobrecimento geral e aumenta o ritmo do esgotamento de recursos naturais.

Se eles aumentam os preços e os compradores não os invadem para levar a preço zero, as coisas equilibram-se mais, equalizam-se por baixo, e o consumo diminui.

Essa receita, mais dia, menos dia, tem que se aplicar. Ou seja, os preços têm que aumentar para aqueles que sempre consumiram excessivamente e a preços baixíssimos riquezas finitas que foram produzidas por ninguém, como é o caso do óleo. Se isso será feito, em escala mundial, dirá o futuro.

Estranho é que o Brasil comporte-se como rico quando ainda é pobre e pague preço de rico quando ainda é pobre. Aqui, tudo é caro, principalmente porque a enorme maioria é paupérrima. Não se trata aqui de repercutir discurso hipócrita dos predadores reclamando da predação que fazem a favor de si mesmos.

Trata-se de dizer que, quando tudo é caro, é mais caro para os mais pobres. Eles estão pagando um preço por algo que não usufruiram, ou seja, tomam o remédio antes de adoecerem.

Mercados aliviados, Sarkozy e Merkel sorridentes….

Esse negócio que sai nos jornais com o curioso nome de plano de ajuda – ou de resgate – à Grécia, foi aprovado. O governo grego vai tomar emprestados mais cento e tantos milhões, ou são mil milhões,  de euros e a falência formal é adiada mais uma vez.

Nos EUA, Obama vai cedendo, a pouco e pouco, e as coisas tendem ao desfecho previsível: o limite de endividamento aumenta e todo o dinheiro arrecadado com impostos, pagos somente pelos mais pobres, vai para os bancos.

Nesse Brasil de meu Deus – como diria meu querido Rafael – o representante unificado dos grandes bancos resolve que o Estado deve pagar 12,5% de juros anualizados por seus títulos. Uma linda política monetária, resolvida para manter a inércia da drenagem de dinheiro da imensa maioria para os credores.

Uma política bela, que faz de nossa moeda uma das mais valorizadas do mundo, em um país que tem caríssimo e ruim; sim, ao mesmo tempo. É aquela estória de que o mundo vai acabar-se – e pode mesmo – e nós corremos riscos imensos e por isso temos que ter a maior taxa de juros do mundo. Isso, mesmo que a inflação esteja sob controle, mesmo que a dívida pública não passe de 56% do PIB…

Mandam os bancos. E fazem-no por toda parte, seja onde os bancos centrais são privados, como nos EUA, seja onde são aparentemente públicos, como na Europa e no Brasil.

Há uma questão interessante nisso tudo, que pode gerar problemas à medida que as coisas complicam-se. Os bancos pagam-se em dinheiro, em promessas de pagamento – que são a mesma coisa, afinal – ou em coisas mais reais, como produtos, recursos naturais e força de trabalho a baixo preço? Ou aceitam de tudo?

O probleminha pode ficar mais evidente se percebermos que a esticada da corda até uma tensão muito grande pode desacreditar os meios de pagamento. Caso aconteça isso, outro problema tende a surgir: as coisas reais – até mesmo petróleo – podem ficar difíceis de se trocarem. Aí, voltamos a problemas que inquietavam gentes como Colbert, ou seja, voltamos a pensar em ouro, em frações dele monetizadas…

Diálogo entre Colbert e Mazarin. Para função de autoconhecimento e recurso a fontes mais sólidas.

PERSONAGENS:

Jean Baptiste Colbert > ministro de estado de Luis XIV.

(Reims, 29 de Agosto de 1619 – Paris, 06 de Setembro de 1683)

 Jules Mazarin > nascido na Itália, foi cardeal e primeiro ministro da França.

(Pescina, 14 de julho de 1602 — 9 de março de 1661)

– Colbert: Para encontrar dinheiro, há um momento em que enganar (o contribuinte) já não

é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é que é

possível continuar a gastar, quando já se está endividado até ao pescoço…

– Mazarin: Se se é um simples mortal, claro está, quando se está coberto de dívidas, vai-se

parar à prisão. Mas o Estado… o Estado, esse, é diferente!!! Não se pode mandar o Estado

para a prisão. Então, ele continua a endividar-se…todos os Estados o fazem!

– Colbert: Ah, sim? O Senhor acha isso mesmo? Contudo, precisamos de dinheiro. E como

é que havemos de o obter se já criámos todos os impostos imagináveis?

– Mazarin: Criam-se outros.

– Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.

– Mazarin: Sim, é impossível.

– Colbert: E então…os ricos?

– Mazarin: Os ricos também não. Eles não gastariam mais. Um rico que gasta faz viver

centenas de pobres.

– Colbert: Então, como havemos de fazer?

– Mazarin: Colbert! Tu pensas como um queijo, como um penico de um doente!

Há uma quantidade enorme de gente situada entre os ricos e os pobres: os que trabalham sonhando em vir a enriquecer e temendo ficarem pobres. É a esses que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Esses, quanto mais lhes tirarmos mais eles trabalharão para compensarem o que lhes tiramos.

É um reservatório inesgotável!


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