Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

Mês: abril 2012 (Page 2 of 2)

A Presidente Dilma tem 77% de aprovação popular.

77% de aprovação popular, aferidos pelo IBOPE, entidade insuspeita de governismo – na verdade, sempre suspeita de oposicionismo a qualquer coisa minimamente tingida de vermelho, por mais claro que seja.

Isso, a despeito de campanha mediática diária e sistemática contra o governo, a servir-se basicamente da seletividade na ênfase que se põe no escândalo de ocasião. O grande instrumento de ataque da imprensa é a seletividade: dá-se destaque ao que interessa aos desideratos do meio de comunicação e o que não interessa não sai.

É interessante perceber como apostam na estupidez, o que fica evidente no descompasso entre matérias de TV e matérias de jornais e revistas. Supostamente – como está nos manuais – a TV é o meio para os estúpidos e os jornais e revistas para os menos estúpidos.

Assim, revistas e jornais dos grandes grupos de comunicação não puderam fazer de conta que não houve um conúbio mafioso enorme entre um senador da UDN, um criminoso conhecido, um governador da UDN e outros funcionários menores, porque deixariam a banda passar se nada dissessem. Mas, as TVs silenciaram, assim como silenciou a revista Veja, uma publicação de baixíssimo nível, que não é questão de ideologia, mas de associação criminosa mesmo.

A Presidente não é tão genial, politicamente, quanto o ex-Presidente Lula. Mas, tem a possibilidade de governar até melhor que Lula, porque é mais disposta ao confronto e menos gestada na política. Além, é claro, de ser inteligentíssima e culta. E, tem Lula para ajudá-la politicamente, o que não é pouco.

A Presidente deu uma ordem, claro que a deu, para que os dois maiores bancos públicos do país, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, reduzissem suas taxas de juros no crédito à metade! Ao mesmo tempo, reduziu a contribuição previdenciária patronal de vários setores industriais e de serviços a zero!

O que ela quer? Quer fazer um mercado interno ainda mais robusto, estimular o consumo, estimular a criação de empregos. Quem perde imediatamente com isso? 0,5% da população brasileira perde com isso: os bancos privados e seus empregados na imprensa e nos partidos políticos.

Os bancos privados terão que reduzir suas margens de lucros com empréstimos cariíssimos, que hoje os sustentam. Porque, se não seguirem o BB e a CEF, ficarão para trás. E eles os podem seguir, sem riscos de quebrarem, apenas terão que ganhar menos…

Enquanto isso, uma parte da imprensa fala mal das medidas, mesmo que sempre tenha insistido na estória dos juros serem muito altos e os impostos também. É cômico ver o pessoal dos media tentar falar mal do que sempre defendeu, servindo-se dos argumentos mais tortuosos, como se dissessem é bom mas é ruim! É o que eles pediam, precisamente, mas têm que falar mal, por questões de política golpista.

A Presidente deu à imprensa raivosamente golpista o papel ridículo, o que foi genial! Enquanto eles dizem é bom mas é ruim, o povo percebe as coisas, a despeito de ver TV e a despeito da classe média ler avidamente o lixo editorial que se publica semanalmente.

77%… Realmente, é quase nada.

O excelente agride o vulgo.

Não escrevo somente a propósito do jogo entre Barelona e Milan – e principalmente pela forma como o jogo foi narrado e comentado – mas para falar de uma forma de estar diante das coisas, generalizada. O vulgo é agredido pelo excelente, porque o vulgo acredita-se régua e objeto a ser medido, em tudo.

A prová-lo, pelo paradoxo, temos a mania do vulgo de sempre objetar àlgum comentário ou percepção mais elevado o nunca se dever fazer generalizações. Ora, a generalização é precisamente o pano de fundo sobre que se destaca o extraordinário, ou o incomum, ou o sublime, ou o sutilíssimo aspecto a não ser visto. Uma generalização não se basta como proposição, ela fará aparecer, por tênue contraste, o que está fora do alcance da vista média.

Assim, embora o vulgo goste da oposição do não generalizes, ele vive sua zona de conforto na generalização que, de tão ampla, faz do excepcional não o aspecto de relevo, mas um ponto apenas mais distante do grande geral que é a percepção comum. Ou seja, o geral do vulgo tem as excepções normativamente previstas, como a dizer que ele cogita de exceções, quando, na verdade, delas não se quer aproximar.

O vulgo diz que toda regra tem excepções a repetir um lugar-comum sem cogitar o que possa significar. Não é à toa que teme, mais que a qualquer outra coisa, a esquizofrenia, a dissociação absoluta, o inapreensível no esqueminha habitual de afirmar qualquer coisa acriticamente.

O museu do Louvre – mudo de discurso esquizofrenicamente, súbito lembrando da desconcertante pergunta que já escutei de um – vive cheio de gente e está supostamente repleto de obras de arte. Pode-se admitir que dentre o grande número de obras, haja delas excepcionais, sublimes, até. Pois bem, o estar o Louvre sempre cheio quer dizer que o vulgo admira a arte, a beleza, algum sublime? Não, quer dizer que os donos do Louvre são gênios que perceberam a alma vulgar, que facilmente obriga-se a certos comportamentos.

O vulgo e o médio são a mesma e terrível coisa. Ele não pode, como podem o comum de aldeia e o excelente, por exemplo, dizer que a Gioconda é uma merda. Ele não pode porque não pode – violaria o dever de ter uma certa declarada opinião – e porque realmente nada acha daquilo. Na verdade, cumpre uma obrigação que a falta de liberdade a permear-lhe a vida impõe-lhe, e só.

O vulgo gosta do campo, do balanço das folhas, de um ponto alto na curva do rio, de ver a raposa a correr furtiva no mato? Pode ser que goste, mas é mais provável que goste de dizer que gosta, porque em tal ou qual época isso consagrou-se de bom tom. Assim, ele irá para o campo, não para ver o que próprio ao campo é, mas para ver e ser visto pelo resto da massa vulgar que se pôs em marcha para o mesmo.

Bem, hoje jogaram Barcelona contra Milan. Para quem anda à volta dos quarenta anos, Milan é um nome mágico, como para os mais novos são os de todas as equipes inglesas, independentemente do que estejam realmente fazendo. O Barcelona é uma equipe fora do comum, que pode vencer ou perder, mas sempre oferece um espetáculo de balé futebolísitco. É de tal forma, que se se pusesse uma pessoa que viu dois jogos de futebol na vida ela perceberia o encanto que há naquela forma de jogar e não esconderia a impressão.

Mas, é próprio do medíocre ver o excelente desde a cela em que está aprisionado. Assim visto, sob a ótica do privado de liberdade, o excelente passa pelo filtro do ressentimento e da inveja do preso que vê a liberdade. Ele é matizado pela racionalidade mais humana que há, aquela que reduz ao meio o que se não fosse meio invalidava o próprio observador, que não conhece o excelente e, por isso, não o pode admirar.

Seria simples se os fulanos que narram e comentam futebol na TV brasileira simplesmente agissem como adeptos típicos, conforme cada época, de Milan, Chelsea ou Madrid. Isso é o mesmo que os funcionários da Rede Globo celebrarem o Flamengo do Rio de Janeiro até hoje, porque ele foi uma boa equipe nos princípios dos anos 1980 e porque o patrão era torcedor desta equipe.

Mas, a coisa vai mais além que submissão ao modelo recebido em uma época. A submissão é ao mais humanamente baixo que há, que é a racionalização pela média, postura indisfarçável e raivosa. Hoje, a cada avanço irresistível de Messi ou de Iniesta ou Alves, correspondia uma objeção a sujerir ineficácia, seguida das habituais inúteis estatísticas: nas últimas dez ou vinte partidas ganhou a equipe A, quando jogou no estádio B ou C.

A sinceridade aflorava ao dizer-se que o Milan devia fazer isso ou aquilo para defender-se, quando, diante dos fulanos, desenrolava-se um espetáculo de futebol de conjunto, dado pelo Barcelona. Eles não podiam ver o Barcelona jogar, que aquilo era pura agressão ao sujeito balizado pelo espírito de manada, pela observação normativa e burocrática.

Ora, muita gente fala do funcionário público como protótipo do vulgo, e está certa. É a média perfeita, composta de falta de nobreza, carreirismo, falsa tomada de riscos, disposição para o discurso longo e vazio, preguiça, oportunismo, cupidez. Isso tudo é verdade, mas é também para toda a camada média, esteja ela no serviço público ou na iniciativa privada. As grandes diferenças que haveria não passam de lugar-comum em que, na verdade, ninguém acredita.

Os fulanos que narram o futebol são funcionários públicos. Eles têm roteiros pre-estabelecidos que não admitem exceções além daquelas previstas que, portanto, não são exceções. São profissionais da leitura rápida e guiada, a quem escapará qualquer coisa excepcional. Escapará, mas existirá. E ele, incapaz de a perceber livremente, vivamente, ficará preso e com raiva. Ele entreverá o excepcional, mas apenas superficialmente e, quase auto-punindo-se, investirá contra ele.

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