Os franceses começaram – divertem-se com os capazes Rafales – o bombardeio da Líbia. Os norte – americanos seguiram-nos e dispararam mais de 100 mísseis de cruzeiro Tomahawk. Assim, muito singelamente, começa a intervenção humanitária dos impérios, a bem de defender os civis nos países colonizados: com bombardeios aéreos e míseros 100 mísseis.

A intervenção humanitária com bombas e mísseis faz-se como sempre: matando e destruindo tudo que se diz defender. A intervenção humanitária a bem dos civis merece um nome próprio no jargão militar atual: ataque cirúrgico. Um dos nomes mais cretinos e inapropriados entre tantos lugares-comuns.

Comparar-se um bombardeio com uma intervenção cirúrgica é algo como falar de uma cirurgia feita com um machado, um cutelo e uma agulha de costurar saco de couro. Não há coisas menos assemelhadas que uma saturação de bombas e uma operação cirúrgica.

Uma cirurgia que se comparasse a um ataque com mísseis de cruzeiro seria um sangramento, uma destruição, um esgarçamento de tecidos, um rompimento de todos os vasos sanguíneos que somente poderiam resultar na morte do paciente. E é isso mesmo.

É cirurgia que se faz em cadáver a ser enterrado desfigurado, costurado a pontos largos, cheio de equimoses e crosta de sangue coagulado, cadáver a ser velado em caixão fechado, de tão feio que é.

Assim defendem-se os civis – porque a palavra dá autoridade, como se militares não fossem gente. Defendem-se civis matando-se civis, claro! E defendem-se civis segundo peculiaríssimos critérios de escolha dos civis que devem ser defendidos.

Civis de outros países não devem ser defendidos, mas os da Líbia devem sê-lo, sendo mortos. Civis de países dóceis ou daqueles em que as revoltas foram docilizadas, esses que cuidem de si. Civis que o rei da Arábia Saudita manda matar não são civis, evidentemente. Civis do Bahrain são alguma coisa diferente.

O caso é que a mão pesada dos Rafales e dos Tomahawks cai sobre os inimigos. Certo, assim funcionam as coisas. Mas, digam-nas, às claras. Digam que matam os inimigos, os que têm a ousadia de revelar que os subornaram, os que têm o petróleo de que precisam.