Presentemente, duas corporações investem contra o desenvolvimento social, econômico e institucional do Brasil: a imprensa e o judiciário. É até difícil saber qual é pior, mas é certo que da imprensa, como instituição majoritariamente privada – ao menos na aparência – não se espera grande coisa, exceto se se for muito ingênuo. Na verdade, vistas as coisas com rigor, a imprensa é pior, até porque é a garantidora e estimuladora das atuais investidas e excessos do judiciário.

 

Claro que é ingenuidade esperar do judiciário que não seja uma corporação a pensar principalmente em si, a despeito de todo o discurso que produz em sua defesa, a partir do mito da imparcialidade. Ora, é próprio das corporações, estatais e privadas, pensarem principalmente nos seus interesses e isso não é o extraordinário.

 

O que permitiu a essas instituições o poder destrutivo e a imunidade que têm foi a apropriação do mito da imparcialidade. Para tanto, trabalha outro mito, no caso específico do judiciário, o da especialização técnica, que seria algo destituído de conteúdo ideológico ou político, algo como a ciência inerte em termos de valores.

 

Amparado nessas ilusões disseminadas com ajuda da imprensa, o judiciário brasileiro faz o que quer, ao custo que for, e permanece imune a qualquer crítica. Porém, um poder imune à maior de todas as críticas – que são as eleições, a crítica democrática – não poderia jamais fazer pouco da constituição, das leis, decidir casuisticamente segundo o capricho momentâneo deste e daquele juiz.

 

Um poder não legitimado democraticamente não pode se arrogar legislador, não pode relativizar garantias, não pode fazer pressão como meio de produção de provas, não pode ter postura exibicionista.

 

Mas, hoje, o judiciário brasileiro não apenas é um poder sem legitimidade democrática sobre que não incide qualquer controle efetivo, como é tudo isso a um custo obsceno. Quando é para extrair conclusões favoráveis aos seus interesses, a corporação  gosta de comparações. Quando as conclusões são-lhes desfavoráveis, não gostam. Claro, nisso são oportunistas.

 

Pois bem, o judiciário brasileiro é o mais caro do mundo! E este preço absurdo foi atingido à margem da legalidade estrita, com a criação de vantagens astronômicas e injustificadas por meio de atos internos. Acontece que a legalidade dessas iniciativas será decidida por eles mesmos, os beneficiários!

 

Por meio do escandaloso expediente das verbas indenizatórias, esses funcionários auferem mais que o teto remuneratório do serviço público. Na verdade, auferem muito mais. Há semi-deuses ganhando em torno a R$ 70.000,00 por mês, o que é aberrante, nada menos. Há verdadeiras festas de auto concessão de vantagens retroativas, sem base em coisa nenhuma além da própria vontade de abrir os cofres públicos em benefício próprio, mesmo quando a situação recomenda austeridade.

 

O Brasil tem a maior relação de funcionários da justiça por cem mil habitantes do mundo. O judiciário brasileiro custa 1,3% do PIB, algo extraordinário para um sistema de resolução de conflitos muito ruim. Na Alemanha, custa 0,3% do PIB e no Chile 0,2%, para ficarmos apenas em dois casos. E não seria digno de ninguém que tenha um cérebro sadio dizer que o brasileiro é melhor que qualquer outro.

 

Não é melhor. É plausível afirmar que é pior e certamente muito mais caro; é uma deformação sem precedentes na história. A média remuneratória do judiciário brasileiro é de R$ 10.000,00, incluindo-se juízes, funcionários, terceirizados, tudo enfim. Isso é cinco vezes o PIB per capita do Brasil, o que revela a magnitude da aberração. Nem os baixos salários dos milhares de terceirizados baixam essa média.

 

Servir-se de manobras ilegais para sugar mais dinheiro foi chegar ao grau zero da honradez. Não que isso seja surpreendente vindo desta gente, mas é um escárnio com o povo deste país, um desdém sem tamanho com quem ao final paga a conta deste convescote imoral.

 

Um semi-deus juiz recebe em torno a cinco mil reais de auxílio-moradia, uma verba sobre que não incidem imposto de renda nem contribuição previdenciária! Por que? Qual a razão disso? O salariozinho irrisório de R$ 30.000,00 não permite o juiz morar em algum canto? Por que todo o restante das pessoas mora à custa dos seus salários e os juízes não o podem?

 

 

Recebem auxílios para se alimentarem, auxílios para pagarem as escolas dos filhos, auxílios para comprarem livros, têm 60 dias de férias remuneradas ao ano, enquanto os mortais têm 30, têm recessos remunerados. Isso são privilégios injustificados, nada mais.

 

Essas aberrações nada têm a ver com garantias para o exercício das funções, são privilégios sem previsão legal, o que é mais grave. Por que em toda parte juízes desempenham suas funções sem essas aberrações remuneratórias e aqui não é possível? Claro que é possível, o que falta é controle social sobre esse corpo autônomo dentro do Estado brasileiro.

 

Falta a esta corporação noção de risco, falta noção de solidariedade social, falta autocrítica, falta conhecimento humanístico, falta autenticidade, falta legitimidade democrática para atuar como legisladores. Para investir contra os cofres públicos desta forma e torcer a constituição do país corriqueiramente a bem de a interpretar, o mínimo que seria necessário era ir a votos ou empunhar armas.

 

Eles contam com a blindagem da imprensa, que silencia sobre essas aberrações enquanto eles estiverem juntos na cruzada golpista e entreguista que paralisa o Brasil. São tão ávidos e imediatistas que não percebem que a imprensa os abandonará tão logo tenha êxito no seu desiderato político, se o tiver.

 

Os realmente poderosos que guiam a imprensa e o judiciário sabem muito bem que se chegarem ao poder central terão de se livrar desta monstruosidade, tanto pelo custo estúpido, quanto pelo que representam de instabilidade, sempre origem de decisões conflitantes, algumas absurdas, outras voluntaristas e quase todas tendentes a gerar o desgoverno.

 

Talvez a única coisa auspiciosa de um governo entreguista direitista resultante do golpe, caso tenha êxito, seja precisamente o expurgo que haverá na corporação.  Isso, porque ninguém governa com uma corporação destas por perto.

 

 

Mas será terrível também porque é previsível que este movimento pendular obedeça à lógica esquizofrênica que governa as mudanças no Brasil. Se o golpe tiver êxito, os golpistas não partirão para ajustar e por os necessários limites a esta instituição fundamental: farão terra arrasada e se servirão da imprensa para desqualificar o judiciário, como sempre fazem com os grupos potencialmente incômodos.