Vejo Barcelona contra Arsenal, no canal ESPN. Vejo e percebo – além do espetacular futebol do Barcelona – como são firmes as prisões da alma.

Os narradores da tal ESPN nasceram em Londres, cultivam a Rainha, tomam chá às cinco da tarde e falam com os incisivos superiores projetados para fora das bocas. São mais britânicos que o Big Ben, mas tentam disfarçar. É pior.

Isso é comum nos escravos saídos das classes médias altas brasileiras. Eles são devotados aos senhores, mais que a si, à beleza, à liberdade. Têm complexo de vira-lata e buscam senhores exteriores. Quanto menos próximos e mais ricos, tanto melhor.

O típico escravo oferece sua devoção ao senhor mais rico e àquele a que acostumou-se a considerar o mais poderoso, o mais tradicional. Os ingleses desempenham bem esse papel de senhores ricos, tradicionais e poderosos, logo são os que mais avidez de servir despertam nos servos brasileiros.

Parece-me que é coisa involuntária, porque narrador de futebol na televisão esforça-se para aparentar imparcialidade. Ou seja, se a servidão, a devoção, transparece, é porque foi maior que algum esforço de contenção. A coisa vem de dentro, é maior que alguma racionalidade, é maior que o assombro de ver este Barcelona jogar.

Eles não dizem mais que lugares-comuns sobre o futebol arte da equipe de Guardiola. Uma e outra obviedade sobre os riscos de deixar Messi dominar a bola. Eles sofrem quando os ingleses perdem o controle, quando batem e tomam cartões amarelos.

Eles amenizam as agressões dos jogadores do Arsenal, a ponto de adentrar o ridículo às escancaras: quando Van Persie meteu a mão na cara de Daniel Alves, o servo narrador pôs-se a dizer que não foi um murro e que por isso não estava caracterizada a agressão!

Bonito, só seria agressão se fosse aos murros. Muito bom…