Um espaço de convívio entre amigos, que acabou por se tornar um arquivo protegido por um só curador.

O incêndio extingue-se quando se extingue o oxigênio.

A afirmação do título não chega a ser uma contradição, senão algo aparentemente contraditório apenas à partida, antes de se pensar um pouco. O fato é que explosões são meios eficazes de extinguir incêndios em ambientes fechados, por causa do súbito consumo do oxigênio disponível.

Essa forma de extinção pode ser extrapolada para os processos históricos e políticos, que podem ser detidos por causa de sua aceleração vertiginosa por forças caóticas internas. Contudo, não é de catarse que falo, pois não há nisso purificação, nem ocorre no âmbito de uma tragédia. Trata-se de um drama.

O golpe de Estado dado no Brasil, em 2016, implicou, basicamente, a presença simultânea de dois elementos: a cobiça externa pelas reservas brasileiras de petróleo e a demofobia das classes média e alta. Sem qualquer um destes elementos, não teria sido possível a deposição da Presidente Dilma. Isoladamente, um e outro não seria suficiente para o processo golpista ter êxito, porque a propaganda mediática dependeu fortemente da demofobia.

A imprensa e a corporação judiciária catalisaram estes dois elementos astuciosamente, a partir de tecnologias adquiridas externamente. O caldo do golpe cozinhou longamente. As classes médias foram deformadas – para além de seu normal – por uma narrativa mediática moralizante, que rendeu bons frutos porque semeada em bom solo. Esse moralismo seletivo demonizou, tanto personagens de ideologia nacionalista, quanto a cadeia de produção de petróleo.

As classes médias são profundamente demofóbicas e identificam-se por cima, como se comungassem os interesses do 01% e este é, dentre muitos, seu aspecto mais estúpido. Essa característica tornou fácil instilar ódio por quem, mesmo pouco, melhorou as vidas dos mais pobres, algo essencialmente imperdoável. A redução de desigualdades sociais apavora as classes médias mais até que as perdas sofridas por ela mesma.

Então, todo o discurso sobre corruções com dinheiros públicos – exclusiva de certo partido, claro – é apenas a capa narrativa de um alerta e de uma promessa mais profundos. O que se diz subrepticiamente é: os de baixo chegam perto de vocês. O que se promete é: deteremos este avanço. O aviso e a promessa, assim como o disfarce moralizante delas, seduzem profundamente o público específico a que visam.

Ocorre, porém, que o golpe não foi nem é algo que se compreenda pelas balizas tradicionais. Não foi apenas um movimento de instalação de ultra liberalismo. Ora, o golpe traz a destruição do mercado interno brasileiro e de milhões de empregos e isso, evidentemente, não é coisa interessante do ponto de vista capitalista. É simples: não se vende na ausência de quem compre.

Tampouco transformará o país em plataforma exportadora, como uma espécie de México em segundo grau, porque os juros praticados não permitem a depreciação do real, moeda brasileira, e encarecem os produtos feitos no Brasil. Assim, o golpe como promotor de vantagens para quem o fez só se compreende como saque de riquezas naturais, nomeadamente minerais. No curso deste saque, os agentes operadores internos recebem suas comissões.

Nada do que se faz como política econômica, pelo governo golpista, resultará em crescimento e, muito menos, em justiça distributiva. Não resultará porque não visa a isto, na mesma medida em que não se ministram venenos a alguém para preservar-lhe a vida ou melhorar a saúde. Ou seja, o programa é, realmente, de terra arrasada.

A destruição de um país com 200 milhões de habitantes, dentre os quais dezenas de milhões aumentaram sensivelmente seus níveis de vida e de consumo nos últimos doze anos, não é algo que possa acontecer muito placidamente, por mais esforço ilusionista da imprensa corporativa.

Não é ocioso repetir que há diferenças entre negar a concretização de expectativas e fazer retrocederem as pessoas a situações materiais precedentes. Enfim, impedir de melhorar é diferente de obrigar a retroceder e a segunda tarefa é muito mais díficil de ser levada adiante com pacífica aceitação, por mais estúpido e anestesiado que seja um povo.

Nem mesmo a atual festa promovida por algumas corporações de servidores públicos, que resolveram pilhar tudo o possível, o mais rápido possível, será viável, em breve. Tanto faltará dinheiro, por um lado, quanto faltará apoio mediático a este saque, uma vez cumprido o papel dado a estas corporações pelos articuladores maiores do golpismo. O divórcio do judicial e da imprensa é algo certo, apenas a data é incerta.

Esta situação permite especular sobre a explosão no processo histórico-político. E creio que mais prováveis são, ou a convocação de eleições diretas, ou um golpe militar.

 

 

 

 

1 Comment

  1. Arthemísia

    Eu vejo grande possibilidade de golpe militar, principalmente porque agora as facções entraram em cena.

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