O Bispo alemão de Roma está na Espanha. Hoje, em Santiago de Compostela, amanhã estará em Barcelona, para consagrar a Sagrada Família, a obra bela e nunca terminada de Gaudí.

Ele reclamou de um secularismo agressivo que haveria em Espanha, um comentário, a princípio, sem qualquer sentido. Se com isso quis dizer que o número de fiéis católicos praticantes recua muito, a declaração começa a ser perceptível, pois é uma constatação.

Todavia, resta algo de estranho na declaração, pois a melhor forma de seduzir não é reclamar da falta de seduzidos e, sim, buscá-los. Fica a parecer excesso de arrogância, como se estranhasse que os espanhóis estivessem a afastar-se, movidos por burrice, supõe-se, daquilo que seria uma adesão óbvia.

Pode ser abordada por outro viés, também. O Bispo de Roma pode estar a reclamar do Estado e do Governo espanhóis, que ele acha obrigados a promoverem uma certa religiosidade. Sucede que o Estado espanhol é laico e assim a declaração é puramente política. Sendo política e vinda de um estrangeiro e ademais ele mesmo Chefe de Estado, parece uma intromissão indevida nos assuntos espanhóis. Uma intromissão contrária à própria ordem constitucional, inclusive.

Talvez fosse melhor o cardeal Ratzinger limitar-se a uma das esferas, a religiosa ou a política. Poderia tentar a sedução da religião que representa, pois há elementos realmente sedutores nela. Poderia transcender-se, ou seja, ao político culto que é, e voltar-se para a promessa da imortalidade, que é muito superior à da justificação e teve em Espanha seguidores profundos.

Poderia falar em Teresa D´Ávila ou em João da Cruz, poderia falar na extrema poeticidade desses místicos ávidos de imortalidade. Poderia falar da ressurreição dos vivos, da transformação, da graça, da escolha, do reino de Deus.

Poderia, por outro lado, ser apenas político e chamar seus seguidores a pressionarem o Governo a dar-lhes apoio explícito e formal e a por na ilegalidade as diferenças. Criaria mal-estar por conta da flagrante e indevida intromissão, porém contaria com o provável silêncio complacente do Governo, desde que não se excedesse muito.

Não devia era lastimar-se de uma secularização agressiva, coisa intangível se dita assim de maneira ambígua. Quer parecer que a religiosidade católica é alvo de alguma perseguição? Buscam tomar-lhes os bens? Afinal, de quê reclama Ratzinger, da perda de fiéis ou da perda de privilégios estatais?