Tenho a impressão de que o pior da imprensa brasileira, que são a Globo e a Veja, experimentam mais uma volta no já apertado parafuso do baixo nível, do partidarismo aberto e da desinformação mal-disfarçada. Chegaram a tal ponto de maniqueísmo rasteiro e de destinação evidente a semi-alfabetizados e nazistas de nascimento que a coisa parece um pedido de socorro.

No caso da Globo, tenho para mim, com poucas dúvidas, hoje, que é sim um pedido de socorro e de acordo com o governo federal. A Globo deve muito a credores privados nos EUA – algo à volta de 2 bilhões de dólares norte-americanos – e deve muito ao Estado brasileiro, por conta de sonegações oceânicas de tributos federais, dívida que corrigida e acrescida de juros chega próximo a 800 milhões de reais.

Não é pouco dinheiro nem para uma grande corporação detentora de alto poder de desinformação e chantagem. Por isso, calculou cuidadosamente os movimentos de ataques infundados e violentíssimos ao governo e seus integrantes, sempre por um nada ou quase nada, na medida cronológica certa para interditar a presidente para as próximas eleições, dando o golpe, ou fragilizá-la a ponto de não precisar do golpe mediático judiciário e ganhar o pleito com qualquer um dos postulantes à direita.

Talvez a campanha moralista dos amorais natos tenha iniciado-se muito cedo, notadamente para empresa que se serviu de expedientes demasiado iníquos até para padrões da imprensa brasileira. Parecia que o governo seria mais covarde que o habitual, mas houve alguma reação à campanha sistemática de agressões quase sempre fundadas em puras inverdades.

Vieram à tona os casos das enormes dívidas de subsidiárias da Globo nos EUA onde, inclusive, a coisa foi parar nos tribunais e soube que girava em torno aos expressivos 2 bilhões de dólares. Soube-se, também, que a empresa fora autuada pela Receita Federal por vários ilícitos contra a legislação tributária brasileira, notadamente manobras para escamotear a ocorrência de fatos geradores de tributos.

O processo no fisco brasileiro montaria, em valores atuais, a cerca de 800 milhões de reais de multa. Este caso teve o agravante de envolver episódios dignos de novela, como foi por exemplo o caso da funcionária do fisco que roubou os autos e teria desaparecido o processo.

Particularmente, apesar das discretas mas desesperadas propostas implícitas de acordo, não creio que fosse inteligente o governo anuir porque acordo com a máfia só faz quem é mafioso e se dispõe a assim agir do começo até ao fim. Aconteceria o previsível: o governo deixaria de ser maltratado por qualquer coisa por três ou quatro meses e mais tarde voltaria a tomar pau no lombo em editoriais e matérias supostamente jornalísticas diariamente, ainda a tempo de jogar-se o resultado do pleito de 2014.

O caso da revista Veja é mais interessante, porque algo vertido em linguagem escrita apresenta por contraste e pela expectativa gerada contornos mais nítidos da baixeza de visão e superficialidade de abordagens. A Veja não pode ir além no maniqueísmo, na superficialidade, na manipulação, na negação da realidade, na distorção dela, na mentira pura e simples, porque ela chegou aos limites viáveis.

Mais além do que já foi, somente se se dispuser a estimular o assassinato de pretos, pobres e petistas somente por o serem, sem mais quaisquer arremedos de desculpas ou sofismas de botequim.

Uma revista destas semanais pseudo-informativas vive, entre outras coisas, do mito da imparcialidade, algo que lhes confere autoridade junto a seu público. Sua prática, além de violar evidentemente a imparcialidade, coisa que não existe nem é necessária na imprensa, consiste em levar o público ao desconhecimento. Assim, muito mais importante que noticiar e moldar respostas do público é deixá-lo na escuridão quanto a tal ou qual assunto, seletivamente.

Não era à toa que o falecido barão da Globo dizia, com muita sagacidade, que o importante não era o que o jornal da noite dava, mas precisamente o que não dava, porque assim era inexistência. Não é preciso ser tão sagaz quanto o barão global para saber que esta lógica diabólica funciona muito bem, mas pressupõe o monopólio da comunicação de massas.

A revista Veja não tem o monopólio das comunicações escritas, mas certamente atinge e seduz metade da classe média brasileira, o que se percebe a toda evidência quando se chega ao trabalho na segunda-feira. Qualquer ambiente de trabalho e principalmente alguma repartição pública terá dois ou três versões faladas do que continha a versão mal-escrita do final de semana passado. Essa gente chega ao trabalho ávida por reproduzir as propostas de linchamento que leu no seu veículo instrutor, bem como as jóias de ciência de astrólogos que a revista veicula.

Ora, a aposta na burrice é das mais seguras que existem, porque ela é superabundante. Acontece que nem todo o público cativo de alguma publicação deste nível integra uma malta criminosa organizada, ou seja, nem todos são empregados diretos e beneficiários do pessoal para quem trabalham as Vejas. Daí que essa gente que é apenas moralista histérica, semi-alfabetizada e demofóbica pode sentir-se traída em certas ocasiões.

Se se retirarem os associados e beneficiários diretos e indiretos da atividade mafiosa da revista e de seus patrões e os visceralmente conservadores – mesmo quando seu conservadorismo é contra si mesmo – restam as pessoas de boa-fé que se assustam e se escandalizam com a imoralidade da semana. Se a revista omite algum escândalo de roubo de dinheiros públicos, como no caso dos trens de São Paulo, ela pode estar sucumbindo à burrice que contra encontrar nos seus leitores.

A parcela do público médio que, mesmo com raciocínio binário, conservador e moralista, vir na capa de outra revista que um esqueminha desviou 500 milhões de reais do Governo de São Paulo, ao longo de vinte anos, e que foi comprovado por depoimentos dos que pagaram o suborno, ao ver na capa de sua Veja a milésima reportagem sobre exercícios físicos, boa forma, emagrecimento e que tais pode sentir-se um tanto traída.

Pois a Veja ignorou solenemente o que nem mesmo a Globo, o Estadão e a Folha de São Paulo tiveram coragem de fazê-lo. Esses outros meios deram a notícia banhada em eufemismos, mas a Veja suprimiu, pura e simplesmente.

A Globo, a Folha e o Estadão são demofóbicos e entreguistas e trabalham a bem da demofobia e do entreguismo, mas parecem não ler ligações umbilicais com certo partido político – ou a disfarçam razoável e esporadicamente – e têm algum instinto de sobrevivência. Dá-se algo notável com a Veja, que é sim e claramente um panfleto de um partido, sem mais disfarces.

Seu jogo é arriscadíssimo, porque o governo não a procurará e porque parte dos que a leem sentir-se-á traída pela gritante seletividade que omite algo impossível de ser ignorado, como é o caso oceânico de roubalheira nas compras de trens à Alstom e Siemens pelos sucessivos governos tucanos em São Paulo. Há conservadores que não integram bandas criminosas: são apenas conservadores e demofóbicos, mas emprestam sinceridade ao seu moralismo pós-udenista. Estes podem sentir-se feitos de tolos.